De minha experiência profissional como a de todo mundo, tenho tido muitas lições aprendidas. A mais recente e interessante se diz respeito à minha passagem pela Universidade. Esta, tem me intrigado sobremaneira pela diversidade, complexidade e por seu comportamento organizacional.
Para começar vale a pena observar de que em minha opinião, não existe nenhuma instituição mais digna do uso da metáfora do que a Universidade com todo respeito ao esforço de muitos pesquisadores que lutam para definir de forma mais precisa tanto o modelo organizacional, quanto o modelo acadêmico. Para chegar a essa conclusão, apesar de prematura, tive que embarcar seis anos atrás na busca de literaturas a fim de desmistificar um pouco o ambiente em que convivo há pelo menos doze anos. Como qualquer processo de investigação científica, continuo evoluindo de forma consistente mas sem conclusões concretas sobre o enquadramento das universidades em modelos tanto na parte acadêmica quanto na parte administrativa.
Talvez num futuro próximo, chegarei a conclusão de que o modelo ideal de universidade é aquele que melhor assimila o contexto da sociedade local, compreende as tendências globais, ajuda no desenvolvimento social e econômico através da pesquisa, ensino e extensão. Este modelo deve ser amparado por um modelo de gestão que promova a competição saudável, premia a competência, promova a meritocracia, respeita a diversidade e o meio ambiente. Ainda, para se chegar lá deve-se buscar a qualificar de forma dinâmica as competências internas para atender as demandas emergentes de dentro e de fora de seu ambiente.
Enquanto tento entender melhor esta definição, tenho buscado uma reflexão por meio do uso das metáforas para representar o modelo de universidade. Com isto, fui buscar na literatura das ciências da administração, a ajuda de Gareth Morgan que em 1996 classificou e sintetizou os seguintes arquétipos e metáforas de organização:
1- Organizações Mecânicas: eficiência, perdas, manutenção, ordem, programas, entradas e saídas, padronização, produção, mensuração, controle e design.
2- Organização Orgânica: Sistema vivo, condições ambientais, adaptação, ciclos de vida, reciclagem, necessidades, evolução, sobrevivência dos que se adaptam, saúde e doença.
3- Organização Intelectual: Aprendizagem, processamento paralelo da informação, controle distribuído, modelos mentais, Inteligência, feedback, variedade dos requisitos, conhecimento e redes.
4- Organização Cultural: Sociedade, valores, crenças, leis, ideologias, rituais, diversidade, tradição, historia, serviço, visão e missão compartilhados, entendimento, qualidades e família.
5- Organização como Sistema político: Interesses e direitos, poder, agendas secretas e acordos a portas fechadas, autoridade, alianças, censuras, gestão de conflitos e formadores de opinião.
6- Organização como Prisão Psiquiátrica: Processos conscientes e inconscientes, repressão e regressão, ego, negação, projeção, superioridade e mecanismos de defesa, princípios de sofrimento e prazer, disfunção e vicio no trabalho.
7- Organização como Fluxo e transformação: mudança contínua, equilibro dinâmico, auto-organizações, sabedoria sistêmica, atratores, chãos, complexidade, efeito borboleta, propriedades emergentes, dialética e paradoxo.
8- Organização como Instrumento de dominação: Alienação, repressão, imposição de valores, carisma, manutenção do poder, força, exploração, dividir para governar, discriminação, interesses corporativos.
Confesso que até o momento não consegui identificar uma universidade das 350 que já pesquisei com apenas uma das metáforas, muito pelo contrario: a maioria tem características claras que combinam os oito arquétipos acima. Desta forma comecei a olhar a Universidade mais como um ecossistema complexo e que dependendo das circunstâncias, pode ser representado por um ou mais arquétipo dos acima apresentados. Ao mesmo tempo, tenho como muito clara a presunção de que a imagem da organização retrata um tecido entrelaçado que combina a cultura e o comportamento de seus integrantes nos níveis, estratégico, tático e operacional.
Desta forma, falando de ecossistema, de cultura e de comportamento, começo a amadurecer a imagem de uma metáfora que pode de certa forma retratar minha percepção especulativa do que vem a ser Universidade à luz da visão de Morgan. Trata se de uma imagem que observa a organização universitária como um ecossistema vivo que simula de forma cíclica o comportamento de seus integrantes em resposta à emergências internas (Ex. insatisfação) ou necessidades externas (Pressão do ambiente externo, político, mercado, social).
Para exemplificar melhor, vou utilizar o ecossistema marinho como arquétipo para a imagem de universidade. Este ecossistema representa um ambiente misterioso, complexo, competitivo e variável, que reúne praticamente todas as condições / questões abordadas por Morgan na construção das metáforas sobre as organizações. Assim, e de forma reduzida, vou construir minha metáfora sobre apenas 3 espécies amplamente conhecidas do ecossistema marinho: O Tubarão, o Golfinho e o Baiacu.
1- Os Tubarões: Agressivos, predadores e oportunistas, os tubarões na universidade, como na vida, podem exercer funções primordiais para o ecossistema. Eles almejam o topo da cadeia alimentar e se atribuem a responsabilidade de manter o controle populacional das presas e servir como um instrumento de seleção natural pois são implacáveis com os mais lentos fracos. Mas eles podem também ser muito nocivos!
Os tubarões na universidade, costumam alimentar suas ambições com os sacrifícios de suas presas, tem um olfato aguçado pelo sangue e o suor dos outros integrantes e uma força tremenda nas mandíbulas capaz de triturara os ossos de qualquer presa. Eles visam o poder pelo poder, usam da repressão e da alienação, impõem seus valores, dividem para governar, discriminam e demonizam seus adversários e lutam por suas agendas particulares…em outras palavras eles tem um comportamento metafórico que combina majoritariamente os estereótipos da: Organização mecânica; organização como um sistema político; organização como prisão psiquiátrica; organização como instrumento de dominação.
2- Os Golfinhos: Inteligentes, flexíveis, velozes, criativos e brincalhões, os golfinhos , sistematicamente tem saltos para fora de suas caixinhas e são sempre dispostos a ajudar. Eles representam a maior ameaça aos tubarões da organização e por isso são suas prezas prediletas. Sua visão de organização contempla os seguintes estereótipos: Organização orgânica, organização Intelectual; organização cultural e organização como fluxo e transformação.
Podem ser considerados fundamentais para o ecossistema da organização por representar um grande potencial para a criatividade e transformação se liderados, treinados e motivados de forma adequada. Os golfinhos buscam o conhecimento e o compartilham, tem uma ambição saudável e seu estilo de liderança é situacional. Eles consideram a tecnologia como ferramenta útil e vêem na criatividade de seus colegas uma oportunidade e não uma ameaça.
Como lideres, os golfinhos, tendem a inspirar seus liderados. São eficientes e precisos no desenvolvimento de suas atividades e sabem trabalhar em equipe.
3- Os Baiacus: Lentos, vaidosos e venenosos, esses pequenos animais marinhos não gostam de profundidade, vivem na margem e se defendem enchendo seu estomago de ar, ou mordendo. Os baiacus da metáfora, são extremamente burocráticos, preguiçosos, invejosos, vaidosos e de pouca utilidade em tarefas complexas e criativas. Eles sempre supervalorizam seu trabalho e inflacionam suas realizações por mais modestas que sejam, adoram ficar em suas zonas de conforto e vivem estressados e se inflamam por qualquer motivo. Esses peixes pequenos, medem seu sucesso pelo fracasso dos outros e adoram criar ou reproduzir falácias sobre seus adversários. Sua produtividade é medíocre e sua vontade de aprender é menor ainda. Eles defendem suas caixinhas e lutam contra qualquer mudança por menor que seja. São tolerados pelos tubarões pois são especialistas em bajulação e não medem esforço para manter o ambiente na mesmice. Ao contrario dos tubarões e golfinhos, essa espécie não adota nenhum dos estereótipos de Morgan e vive de acordo com a maré desde de que esteja dentro de sua zona de conforto.
Na minha concepção, das TRÊS espécies mencionadas o Tubarão e o Baiacu são os mais nocivos à organização universitária e o que devem ser colocados sob observação. Para manter o equilíbrio natural, é claro não se pode extinguir nenhuma das espécies do ecossistema. Mesmo assim, fica cada vez mais claro para mim de que há espaços cada vez maiores para Golfinhos na Universidade moderna de que para Tubarões e Baiacus.
De qualquer maneira, é necessário responder às seguintes questões antes de envergar pelo processo de reflexão sobre a natureza funcional / comportamental e metafórica de seu ecossistema universitário:
1- Qual é o posicionamento de mercado que se deseja para minha Universidade;
2- Que modelo de Universidade é o mais adequado à esse posicionamento;
3- Que modelo de gestão deve operacionalizar esse modelo;
4- Que tipo de competências é necessário para essa operacionalização.
Um conselho: Faça o mapeamento das espécies marinhas de sua universidade; feito isso, tome cuidado com os tubarões, proteja e alimente os golfinhos e mantenha os Baiacus sob controle. Quem sabe assim poderá manter seu ecossistema equilibrado.
Todos criticamos a vaidade na academia e ao mesmo tempo a veneramos vide nossa ritualística, os títulos o próprio processo de ensino e aprendizagem na apropriação e disseminação do conhecimento e sobretudo nos duelos intelectuais. Por isso arrisco em dizer de que nossas universidades estão servindo como incubadoras de Baiacus, excelentes cenários para os tubarões e um matadouro de golfinhos.
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